B.O.

Créditos da imagem: Netflix/Divulgação

Séries e TV

Crítica

B.O. se esforça em dar um sotaque brasileiro para fórmula americanizada

Bebendo de algumas fontes óbvias, série do Leandro Hassum para a Netflix é um quase acerto

Omelete
4 min de leitura
16.09.2023, às 14H00.
Atualizada em 16.09.2023, ÀS 14H24

Vamos tirar logo a comparação óbvia do caminho: B.O., a nova comédia criada e estrelada por Leandro Hassum em sua colaboração com a Netflix, é extremamente parecida com Brooklyn Nine-Nine. Os paralelos surgem logo nas primeiras cenas: um policial recém-chegado do interior tem a missão de assumir o violento 8ª DP da Polícia do Rio de Janeiro. Medroso, bobalhão e fã número um de Sandy & Júnior, cabe ao delegado Suzano (Hassum) conquistar uma equipe repleta de policiais que “não seguem as regras”, com excentricidades bem definidas e, obviamente, sem o menor interesse de serem liderados pelo novato – tanto é assim que, muito cedo, os policiais já iniciam suas apostas para saber quanto tempo o Bundão (como o apelidam carinhosamente) conseguirá aguentar o tranco. 

E por inusitadas, entenda uma senhora em busca de costurar seu ursinho de pelúcia, um caso de apreensão de brigadeiros de maconha ou a captura de foliões sem noção (e com as piores fantasias do mundo). Logo fica claro que a série vai partir de uma premissa aguda - a realidade policial do Rio de Janeiro que não se prestaria automaticamente para o riso - para trabalhar em cima do talento de Hassum para a chanchada. Historicamente, é a partir da chanchada que a comédia nacional lida com questões sociais agudas e em B.O. não é diferente. Há nisso uma tradição local a seguir, que vem de décadas, e nesse caso ela não tem a ver com Brooklyn Nine-Nine

O problema é que a produção perde boa parte do seu tempo tentando traduzir piadas em inglês ou adaptar costumes americanos para um texto em português, como colocar uma meia na porta para indicar que está acompanhado no quarto (sério, quem faz isso no Brasil?), deixando óbvias algumas das suas referências. Por exemplo, no episódio ambientado na cidade natal de Suzano, que apresenta sua delegacia, uma versão completamente oposta da 8ª DP, há uma mistura da cidade vizinha de Parks and Recreation com o episódio de Seinfeld com a trupe do Jerry Bizarro. Mas ainda existem acenos a The Mindy Project, The Good Place e outras comédias de Michael Schur.

A série opera então nesse meio termo entre uma tradição da comédia nacional e a tentação de adaptar para o Brasil formatos de sucesso no exterior, um processo que não é novidade no nosso audiovisual. Quem organiza essa mistura e tenta tirar dela algo consistente é a figura de Suzano. É possível descrever o personagem de Hassum com a doçura de Jake Peralta (Andy Samberg, de Brooklyn Nine-Nine) e com a falta de noção de Michael Scott (Steve Carell, em The Office) – mas ele não é um completo desvairado. Carismático, Suzano é a força motriz da série, e acompanhar sua jornada é recompensador durante os oito primeiros episódios da temporada. Suzano não tem maldade no coração e tem de assumir uma grande responsabilidade na força-tarefa. O que testemunhamos com ele ao longo da primeira temporada é uma jornada de herói ao seu modo – e quase similar ao do Leão em O Mágico de Oz: um peixe fora d'água (e desprovido de confiança), tentando se adaptar a um novo ambiente e em busca de coragem para assumir os B.O.s da delegacia. E tudo isso enquanto canta e dança "Dig-Dig-Joy". 

É impossível não esboçar meio sorriso quando ele menciona seu posto de presidente do fã-clube de Sandy & Júnior ou quando se atrapalha em algumas de suas investidas à inspetora Mantovani (Luciana Paes). Aliás, brincar com Sandy & Junior, com os problemas burocráticos na hora de abrir um simples B.O. ou estabelecer regras e modos para se comunicar com um crush por meio do "zap" ou do Instagram é quando o seriado ganha uma identidade própria. No meio de tudo isso, há uma série de personagens que, mesmo caricatos, trazem carisma suficiente para andar com as próprias pernas e fazer valer a pena o destaque, como a investigadora Inaê (Babu Guerra), Rabecão (Digão Ribeiro) ou Pardal (Taumaturgo Ferreira).

Confesso que parecia fácil a tarefa de lidar automaticamente com uma série como B.O. como uma tentativa de reproduzir localmente um enlatado estrangeiro de sucesso. Mas, aos poucos, o universo, os personagens, as histórias bobas e o desenrolar das coisas conquistam em B.O. Nem sempre se espera que uma comédia que claramente se inspirou em uma série já estabelecida tenha a oportunidade de demonstrar seu valor. Ainda não há uma definição sobre um possível retorno de B.O. Mas, caso ganhe uma segunda temporada, que a série tome tempo para deixar seu texto o mais brasileiro possível e não mais continuar apoiada na tradução.

Nota do Crítico
Bom
B.O.
Em andamento (2023- )
B.O.
Em andamento (2023- )

Criado por: Leandro Hassum

Duração: 1 temporada

Onde assistir:
Oferecido por

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